Educação Popular na atualidade: análise das possibilidades e dos desencontros


"Tornar a escola popular não implica torná-la substancialmente diferente da escola das elites; é esta a escola que as classes populares querem arrancar do Estado, submetendo-a à sua critica sem deteriorar sua qualidade nem abdicar do seu conteúdo".
Vanilda Paiva
Na crença de que a história não chegou ao fim, que o ideal de construção de uma sociedade mais bela em sua essência continua vivo, a EP aqui já tratada através de outro post procura constituir-se como uma possibilidade alternativa para a educação de jovens e adultos.

Concebemos que a educação por si mesma, sozinha, não é capaz de transformar. No entanto, sem considerá-la, não se consolidará a conscientização das massas pela sua opressão e também da elite pela necessidade de torná-la menos opressora e mais solidária. 


Falar de EP atualmente, significa considerar a realidade social concreta como ponto de partida para um ato de educar que gera felicidade a todos – alunos, professores, escola, sociedade, mundo. Mas essa mesma realidade, tão abordada nas últimas décadas, tornou-se “chavão” em qualquer programa ou projeto pedagógico. Sabemos o quão distanciada das práticas educativas ela se encontra.
Cabe aqui um convite para encararmos o desafio de “olhar” a realidade, enxergá-la de fato e buscar nela, e através dela, as ferramentas que necessitamos para ensinar os indivíduos, frutos dessa realidade, a ler, escrever e revertê-la para o bem de todos.
A divisão social da população parece cada vez mais solidificada, mostrando-se forte e presenteira em meio à imensa desigualdade sócio-econômica entre as classes sociais. A exploração e os mecanismos autoritários pelos quais os trabalhadores de baixa renda eram submetidos ainda prevalecem.


Como já dissemos, a EP que nos anos 60 preconizava a libertação dos sujeitos da opressão em que estavam submetidos, hoje pode ser considerada tão atual quanto fora àquela época.

Articular os princípios da democracia, traduzida na forma da participação efetiva dos sujeitos nos processos e atividades sócio-político-econômicos do país, da solidariedade face às diferenças sócio-econômicas, da justiça frente à garantia de direitos das pessoas, bem como o cumprimento dos seus deveres, da paz tão desejada e perturbada pelas ondas de violência advindas de diversas esferas e setores da nossa sociedade – os excluídos, os marginalizados, os “desviados” do bom caráter, os representantes políticos e suas “falcatruas”, as doenças, o descumprimento das leis em prol de benefícios próprios ou de grupos individuais, os preconceitos de variados aspectos, a negação de ir e vir, do direito de conhecer, dentre outros tão importantes, com uma educação voltada para jovens e adultos que por pertencerem às classes sociais menos favorecidas já carregam uma bagagem de exclusões e negações de diversas ordens em suas vidas, é tarefa gigantesca no contexto social em que vivemos.

Pensar a EP nos dias de hoje só faz sentido se junto dela caminhar a identificação das necessidades dos sujeitos da classe popular e o desejo de atendê-las por parte daqueles que detêm o conhecimento que fora negado a eles.

Ferramentar com a leitura e a escrita, jovens e adultos, pobres, calejados pela ação do tempo em suas vidas, abalados afetivamente ante suas próprias condições de não saberem ler e escrever, requer a superação do desafio de romper com as práticas tradicionais de alfabetização que há muito já se mostraram ineficientes. Estas, há muito já contribuíram para colocar na condição de alfabetizando os jovens e adultos que temos hoje em nossas salas de aula.

E o desafio se torna ainda maior se pensarmos que muitas vezes o educador não sabe para onde ir, que caminho deve tomar para chegar aonde sequer sabe. E então, precisaremos nos reportar ao que já dissemos antes: o educador precisa tornar-se pesquisador da própria forma de aprender, de ensinar, de falar, de ouvir, de se sensibilizar.

Sabemos também que não basta dizer a um colega, ainda preso àquilo que lhe fora mal ou bem ensinado no curso de formação, que “não é mais assim que se faz!”, “Agora, deve-se ensinar a ler e a escrever com textos!”. Tão importante quanto dar aos alunos da EJA as ferramentas de que precisam para enfrentar o mundo e, no mínimo, sobreviver nele – a leitura e a escrita- é também instrumentalizar os professores para esta nova (antiga) forma de ensinar. Trata-se de conscientizar o conscientizador.

Praticar Educação Popular nos dias de hoje, quer na escola, quer em outros espaços da sociedade civil, exige a convicção de que novas tendências pedagógicas foram (ou deveriam) estar incorporadas ao contexto educacional: Ferreiro, Vygotsky, Wallon, dentre outros.

É conhecendo estas tendências, procurando inter-relacioná-las entre si e com os saberes advindos da prática, que os educadores, bem como todos os membros envolvidos com a responsabilidade de ensinar a ler e escrever aos jovens e adultos, precisam estar atentos às necessidades sócio-educacionais, “acompanhando de perto todo o seu processo de desenvolvimento como meio de poder assegurar às classes populares um ensino rigoroso, acessível a todos e correspondente às necessidades: isto cabe aos ‘movimentos’ (SÀ, 1987, p. 21).

Acreditar que a luta que resultou no aparecimento de uma educação gerada em movimentos de ação popular, em meio a utopia latino-americana de superação da condição de terceiro mundo, é a luta que temos ainda hoje para enfrentar.

Gadotti (1998), nos ajuda a refletir sobre a EP na atualidade quando diz que a discussão do paradigma da EP se potencializa no contexto atual brasileiro, face ao debate dos Parâmetros Curriculares Nacionais, ao se deparar com “a concepção dominante de educação que reforça, na prática, a exclusão social e a insolidariedade humana”.

A EP atualmente acontece através de grupos de ações não-governamentais, igrejas, cooperativas, dentre outros. Essas ações são isoladas e na maioria das vezes, incorrem na descontinuidade, que acaba por contribuir para a má formação do sujeito.

Hoje, muitos ainda vêem na EP um potencial a ser explorado, que é a educação profissional, ou funcional. É o treinamento de mão-de-obra para torná-la ainda mais produtiva. Mas a EP que queremos é aquela que se dirige na contramão deste sentido, que se distancia da suplência, por não carregar valor em si mesma. É aquela em que os indivíduos letrados, conscientes, atuantes em seus meios, estejam aptos para escolher aquilo que desejam para suas vidas, e não aquilo que lhe impuseram.

Conversaremos mais adiante, conforme vossas reflexões nos influenciem.

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